segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Sobre Quimioterapia

Em todos os posts que escrevo, de uma maneira ou outra a quimioterapia está envolvida. Isto ilustra o papel de tal tratamento no dia a dia do oncologista. É o tipo de medicação que está sempre atrelado ao mencionarmos o câncer, e é dela que muito do medo que envolve a oncologia se origina. Muito falamos sobre a quimioterapia, mas sabemos o que é realmente? Sabemos para que serve? Muitos podem pensar que sim, mas geralmente estão errados



Partimos do principio que a neoplasia (outro nome para o câncer) se origina de células normais do corpo humano, e que em algum momento perdem suas funções naturais, passando a se replicar desordenadamente e indefinidamente. O tratamento, portanto, envolve controlar a multiplicação celular desordenada, ou destruir as células doentes. Os mecanismos pelos quais as medicações atuam são vários, e nem todos exatamente conhecidos. Fato é que hoje existem dezenas, senão centenas de medicações diferentes para os vários tipos de tumores conhecidos.



A quimioterapia pode ser usada em várias situações: Curativa, adjuvante, neo-adjuvante e paliativa



Quando curativa, nas doenças hematológicas e tumores de testículo, por exemplo, o uso exclusivo da quimioterapia pode promover a resolução completa e definitiva do problema, sem a necessidade de outras modalidades de tratamento.



Na adjuvância, a medicação é usada após um tratamento definitivo (geralmente a cirurgia, mas a radioterapia também se inclui). A doença é totalmente removida, e em seguida procura-se aumentar as chances de cura ao indicar um fármaco que é capaz de destruir eventuais células doentes, não detectadas pelos exames de rastreamento atuais. É muito usada principalmente em doenças como o câncer de colon, reto e mama.



Na situação neoadjuvante, opta-se por realizar a quimioterapia antes do tratamento definitivo, com intuito principal de reduzir o tamanho da lesão, permitindo que a cirurgia possa ser realizada de maneira mais tranqüila e conservadora, mutilando menos o paciente. O câncer mama, reto e laringe são os alvos principais deste tratamento.



Por fim a paliação. Muitas vezes incuráveis, as neoplasias mesmo assim podem ser controladas de maneira eficaz com a quimioterapia. Nesta situação procura-se aumentar o tempo de vida, mantendo sua qualidade, com o controle da dor e de outros sintomas, como falta de ar, tosse, problemas ósseos, entre outros. Busca-se sempre a opção com menor potencial tóxico e a maior chance de promover benefícios, sabendo que o bem-estar é o principal objetivo a ser atingido



Essas quatro situações fazem parte do cotidiano do oncologista. Como podemos notar, apenas uma delas é realizada na vigência de doença incurável. Enfatizo, portanto, que a quimioterapia não é uma sentença de morte, e sim um tratamento medico validado e muito importante no manejo desta doença tão complicada.



No próximo post discutirei sobre os efeitos colaterais da quimioterapia

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Oncologia e religião

Estive recentemente em um congresso sobre bioética e medicina paliativa aqui em Londrina. Embora as palestras dos meus colegas da saúde tenham sido extremamente interessantes, confesso que a que mais me chamou a atenção foi a de um teólogo, explicando sobre o papel da religião e espiritualidade no paciente terminal.


Como a oncologia envolve muitas pessoas na terminalidade, achei pertinente. Vou deixar claro que não sou teólogo, não entendo de teologia e nem de filosofia, e por isso já peço desculpas de estiver falando alguma besteira ou redundância.


A primeira consideração interessante colocada foi sobre a integralidade do ser humano. Não se trata o corpo sem tratar o emocional. Citou a historia de uma moça que tentou se matar, não conseguiu, ficou vários dias na UTI, todo o investimento para salva-la. Assim que recebeu alta ela vai e pula de um prédio. Essa pessoa foi tratada? Do ponto de vista biológico sim, mas o resultado final fala por si mesmo.


Tais abordagens foram citadas como “máximos e mínimos.” Mínimos são as atividades e cuidados que todas as pessoas tem direito e deveriam receber: higiene, medicação, dignidade, tratamento médico. O Máximo seria todo o suporte que em um primeiro momento pode parecer trivial para o profissional que está afundado nos problemas do dia a dia: suporte emocional, psicológico, espiritual. Todos os complementos mais “elaborados” que na maioria das vezes passam batidos pela equipe médica, mas para o paciente fazem toda a diferença.


O mínimo, todos deveriam receber. Isso é lei, está na constituição. O máximo deveria estar à disposição, e ser oferecido às pessoas que o procuram


Aí entra o papel da religião. Não sou uma pessoa religiosa, mas só quem vive o que o oncologista vive para saber que a maneira que uma pessoa reage psicologicamente frente à doença faz toda a diferença. O otimista, quem tem fé, quem encara a situação de cabeça erguida, por algum motivo sempre suporta melhor, recupera melhor, acaba o tratamento mais rápido. Nada de ciência nisso, só uma observação pessoal.


Ter aonde se apoiar é valiosíssimo. O exercício de fé de algumas pessoas é suficiente para levá-las até o fim do tratamento sem tanto sofrimento, ou pelo menos com um sofrimento melhor elaborado pelo individuo. A fé como recurso de suporte é extremamente importante, quando presente em “medidas terapêuticas.” Não é o caso da pessoa que abandona o acompanhamento medico porque fez uma cirurgia espiritual ou foi exorcizado ou qualquer outro recurso cientificamente não-válido. Já falei em posts anteriores que não tenho nada contra esses procedimentos, com exceção daqueles que estimulam a pessoa a abandonar o tratamento cientificamente comprovado.